quarta-feira, 3 de abril de 2013

Irmão Maior (Morro Dois Irmãos - Leblon)

Realizada em 08 de março de 2013


Em plena sexta-feira, meu grande camarada e xará Guilherme "Bob Marley", me convocou para uma subida ao Irmão Maior por conta dos seus cumpleaños...


Não podia fazer essa desfeita com meu brother e lá fui eu ao Leblon encontrar parte da rapaziada que estava de prontidão no Posto 12. Depois de um bom banho de mar e algumas sessions de surf de peito (vulgo jacaré), lá fomos nós rumo ao Vidigal.


Depois da pacificação, ocorrida em janeiro de 2012, o acesso ao cume do Irmão Maior ficou desimpedido de qualquer anomalia que possa surpreender o trilheiro destemido. É uma caminhada rápida, fácil e com um visual de encher os olhos de qualquer um, seja carioca ou turista estrangeiro.


A trilha se inicia próxima à quadra esportiva no Alto do Vidigal onde está instalada um posto da UPP. Para chegar lá é preciso pegar uma kombi que vá para a localidade conhecida como Arvrão. O ponto de embarque fica no começo da Rua Presidente João Goulart (a principal via da comunidade) em frente a uma lanchonete chamada Pizza Lit.


O ponto final da lotação fica próximo à quadra, desça e siga a pé em direção a duas ou três jaqueiras já no final da Rua Presidente João Goulart. Após passar pelas árvores, existe uma casa azul claro à direita com um belo mosaico de azulejo em formato quadrangular. Entre nesse beco e suba a canaleta por trás das casas (o caminho é esse mesmo, não estranhe!).


Com os fundos das casas à esquerda, você vai passar por uma imensa caixa d'água cilíndrica e uma obra de engenharia, ambas à direita da canaleta, até o seu final. A partir daí é só pegar a trilha que sobe à NW e em menos de cinco minutos atingir o primeiro mirante e curtir o visual de São Conrado. 


Esse primeiro mirante fica em um pequeno platô; reza a lenda que esse ponto era a cabeceira de uma antiga rampa natural de voô livre. Desativada há mais de duas décadas, hoje a inclinação da encosta está encoberta pela vegetação.


Para subir o Irmão Maior não tem erro, é só seguir pelo dorso da montanha na direção ENE. É possível avistar o cume do início da trilha que por um breve instante vai descer e atravessar um pequeno vale.


O próximo mirante mostra o bairro da Rocinha, considerada a maior favela do Brasil que vista do alto realmente impressiona. Por estar bem próxima ao luxuoso bairro de São Conrado é o retrato mais fidedigno da desigualdade social do país.


A Rocinha teve sua origem no final da década de 1920, quando era uma enorme fazenda de café. No princípio suas terras foram divididas em grandes glebas para consumo agrícola. A  partir dos anos 1950 aumentou a migração de nordestinos ao Rio de Janeiro, principalmente direcionados para a Rocinha. Entre 1960 e 1970 houve o segundo período de expansão, motivado pela oferta de emprego a partir da construção dos túneis Rebouças e Dois Irmãos, com o objetivo de melhorar a integração da cidade.  


Daqui se tem uma visão privilegiada do contraforte da Serra da Carioca, que consiste no prolongamento do Maciço da Tijuca para leste. Na verdade toda essa área equivale ao setor B do Parque Nacional da Tijuca onde se situam os famosos mirantes da Estrada das Paineiras. 


Olhando pra NW, na outra encosta da Rocinha, temos o Morro do Cochrane (718m), em alusão ao médico escocês Thomas Cochrane que em meados de 1855 residia na Gávea Pequena.  O doutor Thomas Cochrane foi um dos introdutores da homeopatia  no Brasil; porém, mais famoso, era o seu primo-irmão Lorde Thomas Alexander Cochrane que se destacou como oficial da Marinha Real Britânica durante os movimentos de independência da América.


Além do Morro do Cochrane, na mesma perspectiva temos o Morro do Laboriaux (474m) e a Ponta das Andorinhas (678m), também conhecido como Cochrane Leste. Ambos podem ser acessados por uma trilha que sai do alto da localidade conhecida como Vila Laboriaux, distribuída ao longo da cumeeira divisora que separa a Gávea da Rocinha.


Um levantamento do IBGE feito em 2000 constatou que a comunidade da Rocinha é a mais populosa do país, com 69.161 habitantes. Porém esse quantitativo é considerado controverso e foi alvo de vários questionamentos feitos pela Associação de Moradores. Estima-se que a população da Rocinha esteja entre 180 mil e 220 mil habitantes, segundo informações da União Pró-Melhoramentos dos Moradores da Rocinha (UPMMR).


O que chama muito a atenção é a proximidade de dois universos completamente diferentes: de um lado temos um mosaico urbano caótico da Rocinha e do outro temos o bairro de São Conrado com seus edifícios luxuosos e suas ruas planejadas.


Foi anunciado pela Presidente Dilma por conta do PAC-2 um projeto de construção de um teleférico na Rocinha, análogo ao que foi feito no Complexo do Alemão. Porém, os moradores sabidamente anunciaram que a prioridade é o investimento no saneamento básico que convenhamos já deveria ter sido resolvido a muito tempo.


Não por coincidência, a praia de São Conrado é constantemente reprovada no quesito balneabilidade, considerada imprópria para banho quase sempre ao longo do ano. Não é difícil ver línguas negras na areia e o mar salpicado de lixo em períodos de chuva. Um descaso que já dura décadas em um dos bairros com o IPTU mais caro do munícipio. Despejos de esgoto já foram flagrados mais de uma vez como o que aconteceu nas encostas do Vidigal (foto abaixo) em janeiro de 2014.



Esse é um problema antigo que parece não ter solução, pois nos últimos anos, por diversas vezes, a imprensa já mostrou esgoto no mar e nas areias de São Conrado. Em fevereiro 2001, quando era secretário estadual de Meio Ambiente, André Corrêa prometeu  acabar com a contaminação das praias por línguas negras, formadas por detritos das favelas da Rocinha e do Vidigal, e também por ligações clandestinas de esgoto. Pelo visto ficou na promessa pois 15 anos depois ainda vemos essa cenas lamentáveis.






Apesar da neblina que ameaçava ofuscar nossa visão, fomos agraciados com essa panorâmica que encanta qualquer um que alcance o cume do Irmão Maior. Os mais atentos (ou talvez os mais românticos perceberão que a Lagoa Rodrigo de Freitas em um formato de coração. Um espetáculo difícil de traduzir em palavras.









A comunidade do Vidigal está localizada nas encostas do Morro Dois Irmãos que separa os bairros Leblon e São Conrado. Devido à sua privilegiadíssima localização, numa das áreas mais nobres da cidade, sua história está marcada por tentativas de remoção e resistência.


Tudo leva a crer que a comunidade do Vidigal leva este nome em referência ao major de milícias e cavaleiro da Ordem Imperial do Cruzeiro chamado Miguel Nunes Vidigal, considerado um dos homens mais influentes do século XIX durante o Primeiro Reinado.


Devido a seu prestígio, recebeu muitos presentes ao longo da vida. Um deles teria sido uma grande extensão de terra aos pés do Morro Dois Irmãos, onde hoje se localiza a favela. O presente teria sido dado por monges beneditinos por volta de 1820, quando o general Miguel Nunes Vidigal era comandante da Polícia Militar do Estado do Rio. Essa seria a origem do nome Vidigal que primeiramente batizou a praia e depois a favela.




A área ficou em mãos de herdeiros até ser comprada pelo engenheiro João Dantas, em 1886. A expansão da aglomeração urbana começou por volta de 1940, quando era conhecida como Favela da Rampa da Avenida Niemeyer.


Depois da implantação da UPP a especulação imobiliária teve um avanço estrondoso, elevando os preços dos imóveis no Vidigal. Em quatro anos (jun/2009 - jun/2012), o aluguel de um conjugado (com quarto, sala, banheiro e cozinha) passou de R$ 205,00 para R$ 700,00. A compra do mesmo imóvel, que saía por cerca de R$ 10 mil, pode chegar a R$ 40 mil, dependendo da localização e do tamanho.


Todos os dias há movimentação de caminhões e operários com carrinhos de mão subindo as ruas da favela com vários tipos de material de construção. Segundo a Associação de Moradores do Vidigal, a compra de casas por estrangeiros é, em parte, responsável pelo avanço da especulação imobiliária e pela multiplicação das obras.